Imunização
É fato científico que as vacinas trazem muito mais benefícios do que os possíveis efeitos adversos. Mas um grupo de pessoas vem optando por não imunizar os filhos para doenças que deixaram de ser comuns, como o sarampo e a difteria
Aretha Yarak
Calendário básico de vacinação: até os 10 anos de idade, a criança deve tomar as 28 doses das vacinas disponíveis pelo Sistema Único de Saúde (Thinkstock)
Antes de ser erradicada com o uso maciço de vacinas, no final dos anos 1970, a varíola matou 300 milhões de pessoas, contando apenas o século XX. O sarampo, uma doença altamente contagiosa, foi responsável por cerca de 2,6 milhões de mortes por ano, antes de 1980, época em que começaram as intensas campanhas de vacinação. Já os casos de poliomielite, doença que pode causar paralisia infantil, apresentaram uma queda de 99% desde 1988, quando, mais uma vez, a prevenção com vacina teve início. Criadas em 1796, pelo médico britânico Edward Jenner, as vacinas deram início a uma revolução na medicina preventiva – tornando possível evitar a ocorrência de doenças letais e contagiosas. Há quem, no entanto, na contramão de todas as evidências científicas, opte por não vacinar seus filhos. A lamentável ideia encontrou abrigo entre um grupo de pais, grande parte da classe média alta, que vem optando por não imunizar os filhos para doenças que deixaram de ser comuns, como o sarampo e a difteria. Alguns por acreditarem em teorias exóticas e fraudulentas, outros por medo de que a vacina prejudique a saúde da criança e outros ainda, por questões ideológicas, pensam resistir ao que seria uma imposição criada pela indústria farmacêutica. Por um motivo ou outro, a irresponsabilidade pode colocar em risco não só a saúde da criança, mas de todos à sua volta, alertam especialistas."O que estamos percebendo é que há um aumento, mesmo que pequeno, no número de pais que buscam médicos que orientam a não vacinar a criança", diz Eitan Berezin, presidente do Departamento Científico Infeccioso da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP). Apesar de representarem ainda uma pequena parcela da população brasileira, esses pais que optam por não imunizar os filhos para determinadas doenças se concentram nas classes mais altas da sociedade, aquelas que, pelo menos na teoria, tiveram e têm acesso a informação de boa qualidade. Entre os argumentos mais triviais para a recusa está o medo de que a vacina traga problemas sérios de saúde, como o autismo, e a sensação de que é desnecessário se prevenir contra doenças que têm ocorrência baixa.
"Os riscos de a criança desenvolver uma complicação séria em função da vacina são muito menores do que os de ela contrair a doença. Não há nem comparação. E isso não é algo que eu acho ou acredito, é um fato comprovado cientificamente", diz o pediatra americano Paul Offit, um dos maiores especialistas no assunto. Além de professor da Universidade da Filadélfia, é ex-membro do Centro para Controle e Prevenção de Doenças (CDC, sigla em inglês) e autor dos livros Deadly Choices: How the Anti-Vaccine Movement Threatens Us All (Escolhas mortais: como o movimento anti-vacina ameaça a todos nós, sem edição em português) e Autism's False Prophets: Bad Science, Risky Medicine, and the Search for a Cure (Falsos profetas do autismo: ciência ruim, medicina de risco e a procura pela cura, também sem edição em português).
Abastados e desprotegidos — De acordo com um levantamento recente feito a pedido do Ministério da Saúde, e publicado no periódico médico Vaccine, 82,6% das crianças brasileiras tomaram todas as vacinas recomendadas até os 18 meses de idade. O estudo, que avaliou 17.295 crianças das 27 capitais, descobriu, no entanto, um dado inusitado: nas classes mais ricas das capitais mais ricas a vacinação era deficitária. Em São Paulo, por exemplo, 71% das crianças do estrato A (o mais rico) haviam recebido a imunização completa — enquanto no estrato E (o mais pobre), a cobertura era de 81%. "Uma das razões para essa discrepância é a ideia de que é exagero vacinar os filhos contra algumas doenças", diz José Cassio de Moraes, professor da Faculdade de Medicina da Santa Casa de São Paulo, membro do Comitê Técnico Assessor de Imunização do Ministério da Saúde e coordenador da pesquisa.
As vacinas que costumeiramente são mais descartadas são a de sarampo, difteria, hepatite B e da gripe. "Desde a década de 1970 os casos dessas doenças são muito baixos. Esses pais nunca tiveram de lidar, de temer essas doenças, então deixam de vacinar acreditando que o filho não corre riscos", diz Edécio Cunha Neto, diretor do Laboratório de Investigação Médica de Imunologia Clínica e Alergia da USP. Mas, se para muitos a redução drástica nos casos dessas doenças é motivo para burlar o calendário básico de vacinação, para outros, ela pode significar sérias complicações de saúde.
http://veja.abril.com.br/noticia/saude/o-perigo-de-nao-vacinar-as-criancas
Nenhum comentário:
Postar um comentário