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segunda-feira, 12 de setembro de 2011

Sempre bom lembrar...Nirvana: 20 anos do álbum Nevermind

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A icônica capa de "Nevermind" do Nirvana, de 1991.
A história do rock bem poderia ser contada por alguns álbuns. De tempos em tempos, lá vem um disco que “muda tudo“, que revoluciona a maneira de gravar, tocar, executar, pensar ou vender a música e o rock em geral. Aconteceu com Sgt. Peppers Lonely Hearts Club Band dos Beatles, em 1967; Led Zeppellin, da banda homônima, em 1969; Darkside of the Moon do Pink Floyd, em 1973; Nevermind the Bollocks do Sex Pistols, em 1977;  The Number of the Beast do Iron Maiden, em 1982; Nevermind do Nirvana, em 1991; (What’s the Story) Morning Glory? do Oasis, em 1995; Ok! Computer do Radiohead em 1996; Is This It do The Strokes, em 2001; e não termina nunca.
Este mês um dos membros desta seleta lista completa 20 anos: Nevermind a obra seminal do Nirvana, a banda que levou o rock alternativo ao primeiro lugar das paradas e influenciou toda uma geração foi lançada em setembro de 1991 e, portanto, sopra velinhas este mês.

A "formação clássica" do Nirvana: Novoselic, Grohl e Cobain.
O que dizer desse disco? Muito já foi dito e a obra e a banda colecionam fãs, admiradores e detratores, também, mas inegavelmente, Nevermind foi um fenômeno cultural: seu sucesso mudou o panorama da música mundial naquela em que foi a última década na qual as gravadoras de discos tiveram força de impulsionar o mercado. Do seu jeito, o Nirvana contribuiu para a “queda” das gravadoras e até para a emergência do indie rock (o rock independente) que dominou o gênero nos anos 2000.
Por isso, precisa-se entender o contexto em que a obra foi lançada. O fim dos anos 1980 não foi dos mais generosos para o rock. O Movimento Punk promoveu uma ruptura dez anos antes, mas teve que se acomodar no mercado para sobreviver; de modo que, de um lado, promoveu a consolidação de um “mercado alternativo” de música que sobrevivia para além do campo das “grandes gravadoras” ou das “paradas de sucesso”, mas ainda assim eram capazes de acumular público mundo afora por conta do avanço da tecnologia e da informação da época; mas por outro, levou aos excessos da New Age que dão aquela “cara” brega à música dos anos 1980.
Outro ponto inegável é que – para o bem e para o mal – o Movimento Punk matou o rock clássico, tirando do poder a geração dos anos 1960 que ainda comandava o mercado e as paradas de sucesso do rock no fim dos anos 1970, tornando o espírito hippie de Woodstock ultrapassado e o experimentalismo psicodelico algo arrogante e desnecessário. Por isso, os astros advindos dos anos 1960 e 70 que “ousaram” ter algum tipo de popularidade nos anos 1980 tiveram que: 1) aderir à sonoridade New Age tão característica da época (veja o que artistas como Paul McCartney, Eric Clapton e Phil Collins produziram em termos de sonoridade (e não de canções propriamente ditas); 2) serem taxados pejorativamente de “dinossauros do rock“, devido ao seu período fóssil, nomenclatura que marcou gente como Bob Dylan, George Harrison, David Bowie, Neil Young e bandas como Yes, Pink Floyd ou Rolling Stones, que ousaram, em algum momento, fazer sucesso nas paradas e voltar (mesmo que momentaneamente) a momentos de glória (senão artística, como na maioria dos casos; pelo menos em termos de popularidade).

Nirvana: do cenário alternativo para o topo do mundo.
Voltando às duas vertentes do Pós-Movimento Punk – New Age ou alternativo – essas estéticas marcaram a década de 1980 e impulsionaram o mercado fonográfico. Por um lado, a geração “alternativa” conseguiu produzir um material memorável para um público pequeno, como Bad Religion, REM, Pixies; por outro, a sonoridade e estética New Age criou coisas horrorosas e ainda terminou por afetar vários outros gêneros. O hard rock que embalou as arenas de rock nos anos 1970, agora, era tomado pelo New Age em bandas como Bon Jovi ou Europe. E mesmo a grande sensação do fim da década, o Guns ‘n’ Roses, se visto à distância e de modo criterioso, apesar de boas canções, também mantinha a sonoridade/estética característica do hair metal (aquela das bandas que se preocupavam mais com o cabelo do que com a música e que, no Brasil, tem um nome ainda mais saboroso: hard rock farofa).
Ao iniciar a década de 1990, o cenário parecia piorar, com o domínio das paradas de sucesso saindo das mãos do rock e indo parar no pop tipicamente norteamericano, do qual o cantor Michael Jackson era a vertente maior. Não coincidentemente, o cantor que um dia foi negro, voltava “com tudo” naquele ano de 1991, lançando um álbum recheado de videoclipes exibindo sua nova cor branca, canções inócuas e muito marketing e sucesso.
E é isso que torna Nevermind ainda mais importante e simbólico: lançado no dia 24 de setembro de 1991, o disco da capa icônica e simples daquela banda desconhecida chegou ao n.º 01 da parada de sucessos da revista Billboard em 11 de janeiro de 1992, destronando justamente o poderoso Michael Jackson e seu Dangerous.  O resto é história…
A banda
O protótipo do Nirvana se formara em 1985 na cidadezinha de Aberdeen, no Estado de Washington, no extremo noroeste dos Estados Unidos, pelas mãos do cantor, compositor e guitarrista Kurt Cobain. No ano seguinte, ganhou o baixista Krist Novoselic, californiano de origem croata, e a banda começou a fazer shows em barzinhos da região. Os bateristas circulavam rapidamente, só firmando Chad Channing em 1988, já no meio das primeiras sessões de gravação para o que seria o seu primeiro álbum, por meio do selo independente Sub Pop de Seattle. A mesma gravadora se empenhou para lançar uma série de outras bandas, como a Soundgarden.

A banda gostava de posar de irreverente para as fotos. Ternos?
Após um compacto e um canção em um disco coletivo da Sub Pop, a banda teve seu primeiro álbum lançado em 1989, Bleach, pela Sub Pop, e começa a ganhar notoriedade no circuito alternativo, ao mesmo tempo em que admite, por curto período, um quarto membro, o guitarrista Jason Everman. Em meio às excursões sem fim pelos EUA e de uma primeira passada na Europa, o Nirvana terminaria demitindo Channing e Everman e contratando o baterista Dave Grohl, da banda Scream. Este trouxe uma pegada mais forte para o grupo e a contribuição dos vocais de apoio. Seu bom humor também era um dote bem vindo.
Em 1990, o Nirvana começou as gravações de seu segundo álbum, mas insatisfeito com a Sub Pop, se submeteu às grandes gravadoras, encontrando resposta positiva da Geffen, por meio do selo DGC. A gravadora representava artistas como Aerosmith, Asia e lançou os últimos álbuns do ex-Beatles John Lennon, um dos maiores ídolos de Cobain. Entre maio e junho de 1991, o trio Cobain, Novoselic e Grohl se reuniu nos  Sound City Studios, em Van Nuys, no Estado da Califórnia, liderados pelo produtor Butch Vig e com mixagem de Andy Wallace, e gravou o seu mais emblemático álbum.
O sucesso (algo inesperado) de Nevermind mudou a história da música popular recente, mas mais ainda da própria banda. A grande popularidade do grupo permitiu a globalização do termo Grunge, já usado em Seattle para definir àquela música, e levou às paradas de sucesso toda uma nova geração de bandas daquela região, como Soundgarden e Pearl Jam. Aliás, o sucesso do som grunge calcado em um punk um pouco mais limpo (mas não New Age) também permitiu a ascensão de outras bandas alternativas de outras localidades e sonoridades, como Red Hot Chilli Peppers e Green Day.

A capa de "In Utero" incomodou os lojistas e chegou a ser coberta nas lojas da Wall-Mart.
A exposição da fama, contudo, teve um impacto muito ruim na mente perturbada e sofrida de Cobain que começou a viver o conflito de ter se tornado aquilo cuja sua música era a negação: o superstar. A carreira do Nirvana desandou precocemente: em meio às turnês infindáveis pelos EUA, Europa e até uma passagem na América do Sul (Brasil incluso, em 1993), o músico começou a se drogar cada vez mais e a aparentar ser cada vez mais estranho nas entrevistas. O relacionamento conturbado com a também vocalista, guitarrista e compositora Curtney Love, da banda Hole, não ajudou, e a rotina de drogas, bebidas, brigas e prisões do casal virou matéria fácil para os jornais sensacionalistas. A chegada da filha Frances Bean não mudou isso, ao contrário, obrigou o casal a uma batalha judicialpor sua guarda, que era disputada com suas famílias, que os julgavam incapazes de criá-la. Em meio a isso, não houve produção de material novo e, em 1992, a gravadora Geffen reuniu canções dispersas em demos, singles, aparições no rádio e TV para montar o álbum Incesticide que, obviamente, carece de coesão (há quatro bateristas diferentes no disco); ao mesmo tempo em que adquiria o catálogo da Sub Pop e relançava o álbum Bleach mundialmente, permitindo ao grande público conhecer o primeiro disco da banda.
Apesar dos problemas com as drogas de Cobain, o Nirvana conseguiu gravar e lançar o álbum In Utero em 1993, mas não sem antes uma disputa com a gravadora, que julgou o material de inferior qualidade e obrigou uma remixagem de várias faixas. Pouco após o lançamento, a banda fez um esforço de mostrar que “era normal” ao gravar o popular programa de TV Unplugged da MTV, numa sessão tocante, acompanhados apenas de violões, bateria e, ocasionalmente, um violoncelo. Ao mesmo tempo, incorporou um quarto membro: o guitarrista Pat Smear, veterano da cena punk dos EUA (tocou na banda Germs), que veio reforçar a força do grupo ao vivo.

Cobain no acústico: tentativa de parecer normal?
O ano de 1994 começou com uma turnê europeia, mas o estado debilitado de Cobain obrigou o cancelamento no meio, em março. De volta aos EUA, o músico foi obrigado a entrar em uma clínica de reabilitação, mas conseguiu fugir depois de alguns dias. Terminou se suicidando, sozinho em sua casa em Seattle, no dia 05 de abril, embora seu corpo só tenha sido encontrado três dias depois.
Seu mito apenas cresceu após a morte e o espólio do grupo tratou de ser explorado, com o lançamento de materiais como o álbum Unplugged in New York (1994), From the Muddy Banks of the Wishkah (ao vivo, 1996), a caixa Singles (1996), a coletânea Nirvana (2002, que trouxe faixas inéditas, como a última gravação da banda, You know you right, que virou hit) e o Box-Set With the Light Out (2004).
O álbum
Nevermind inicia com Smell like teen spirit, que se converteu na mais famosa canção do álbum e um dos maiores clássicos dos anos 1990. A canção carregada de sentimento pessimista parecia se conectar com a juventude do período e sua popularidade foi assombrosa. Em termos musicais, é simples e eficaz em um esquema de verso e refrão. Há um apelo pop bem forte na maneira como ela foi gravada, o que ajudou a torná-la tão famosa. Mas o sucesso desproporcional incomodou a banda que, após algum tempo, simplesmente a baniu de seu repertório de shows porque não aguentava mais ouvir o público pedir para tocá-la ou repeti-la, assumindo a postura de “se você vem só para ouvir essa música, não se dê o trabalho”. Foi o primeiro single do disco e atingiu o 6º lugar da Billboard, em janeiro de 1992.

Cobain levava sua dor e fúria também para os shows.
Para se ter uma ideia do que a canção representava para o próprio Nirvana, veja como Kurt Cobain a introduziu no último show que a banda fez em Seattle, em janeiro de 1994, e que acabaria, também, sendo seu último concerto nos EUA:
Vamos tocar esta canção porque nosso contrato exige. É a música que arruinou nossas vidas e arruinou Seattle e arruinou a vida de vocês também.
O álbum prossegue com In Bloom, canção que durante algum tempo foi pensada como carro-chefe do disco. É outra letra de alienação e desespero. No clipe, a banda faz uma crítica à sua própria imagem: aparecem imitando um programa de TV dos anos 1960, com o trio usando ternos bem comportados e Cobain com um óculos de aros grossos típico de Buddy Holly; sobre o qual cenas rápidas se irrompem, na qual a banda está usando vestidos e destruindo um cenário.

Muito material postumo foi lançado, como o Box-Set "With the Lights Out".
A terceira faixa é a segunda mais famosa do disco: Come as you are. Com seu riff simples e início direto acertou em cheio a geração dos anos 1990 e se tornou um cartão de visitas especial da banda, bem mais autoapreciada do que a primeira canção. Provavelmente, foi a que mais tocou nas rádios – pois é ainda mais “tranquila” do que teen spirit – e a que mais covers ganhou de outras bandas. A letra fala de uma reconciliação e passa uma mensagem de “pode vir que eu estou desarmado”. Era um sentido simbólico, mas ganhou conotações mais realistas depois da morte do compositor.
Segue-se Breed, uma canção menor. A quinta é Lithium, digamos a terceira mais famosa, com uma estrutura similar a Come as you are e uma intensidade um pouco maior. Na letra a promessa de que ele “não vai pirar” apesar de toda infelicidade e falta de autoestima. Em seguida vem Polly, a primeira balada do disco e uma antiga canção no repertório da banda, que foi tocada de inúmeras maneiras diferentes, lenta, rápida, pesada, o que lhe valeu várias versões lançadas ao longo do tempo. No álbum é praticamente uma canção de voz e violão, mas sofre discretas intervenções de baixo, bateria e até de um violoncelo. O baterista Dave Grohl contribui com os backing vocais. A letra assustadora conta o ponto de vista de um raptor prestes a estuprar sua presa, embora a intenção do compositor fosse tomar partido da vítima, o que termina não ficando claro no produto final.

Nevermind mescla momentos de fúria e contemplação.
Então, após uma série de canções que seriam consagradas com o tempo – Smell like teen spirit, Come as you are, Lithium e Polly – o álbum entra em sua parte do meio, que é um pouco mais experimental. Essa “etapa” começa com Territorial pissings, em que um pequeno pedaço de letra é cantado literalmente até arrebentar as cordas vocais de Cobain. Continua com Drain you que tem uma estrutura punk mais tradicional, mas no meio se transforma em uma brincadeira de mudança de comando na pedaleira da guitarra, alternando momentos de distorção com outros de som limpo.
Vem uma nova “etapa”, agora com canções um pouco mais tradicionais, de pegada punk e certo apelo pop. A primeira é Lounge act que tem uma introdução fantástica e sempre foi uma das favoritas da própria banda. Depois, temos Stay away, talvez a mais simples do disco, uma canção que demorou para ter sua forma final e gerou outras canções (ouvidas nos lançamentos póstumos). No fim, uma pequena piada é quase despercebida pelo ouvinte: Cobain troca a repetição de “stay away” (fique longe) por “god is gay” (deus é gay).

A forte emoção (seja raiva, fúria, tristeza ou dor) nos vocais de Kurt Cobain é uma das forças motrizes do Nirvana.
O experimentalismo volta um pouquinho em On a plain, em que a canção vai desaparecendo no final e os vocais de “hum-hum” de Cobain e Grohl permanecem no mesmo volume. Por fim, um toque melancólico para terminar: Something in the way, outra balada de voz e violão (mas com baixo e bateria mais proeminentes, além do violoncelo de novo), com uma letra triste sobre alguém que mora embaixo da ponte. Aparentemente, tem uma profunda conotação pessoal: Cobain teria dormido uma noite embaixo de uma ponte após ter fugido de casa na adolescência. Talvez por isso, esta canção – que remete a Something in the way she moves de James Taylor e a Something dos Beatles em nome e estrutura – sempre foi especial para a banda e tocá-la era um tipo de ritual.
O grande trunfo de Nevermind em conjunto é a própria expressividade. As letras de Cobain são fortes e o tom pessoal delas é sentido na voz do cantor. Embora esse “detalhe” seja pouco comentado na imprensa, talvez uma das maiores forças do álbum (e da carreira do Nirvana como um todo) sejam seus vocais extremamente emotivos, pessoais, carregados de dor. Em nenhum outro disco da banda – que foram poucos – Cobain canta tão bem. O ouvinte sensível pode arrepiar os pêlos do braço se prestar atenção (saber as letras ajuda, claro).

Consequências
O Nirvana é uma das principais referências musicais dos jovens da década de 1990 e sua carreira e este álbum em particular são pontos importantes da história do rock recente.

Dave Grohl (de azul) continuou em evidência no Foo Fighters, agora como vocalista, guitarrista e compositor.
O grunge se tornou uma das principais expressões da sonoridade rock dos Estados Unidos na década de 2000 e promoveu uma grande influência no mundo todo. Nevermind, o disco que deu origem a tudo isso, virou um marco. O grunge deu a tônica da sonoridade roqueira dos EUA nos anos 1990.
Após o fim da banda, o baterista Dave Grohl fundou o Foo Fighters, onde é vocalista, guitarrista e compositor, que lançou seu primeiro álbum em 1995 e, desde então, é uma das principais bandas do rock mundial, tendo lançado um novo disco este ano. Pat Smear fez parte da primeira formação e voltou este ano.

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