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segunda-feira, 28 de novembro de 2011

O culto ao atraso



No início deste ano, tive a oportunidade de entrevistar Ícaro Moreno, presidente da Empresa de Obras Públicas do Rio de Janeiro (Emop). Na ocasião, produzia uma reportagem para uma série da revista PLACAR sobre os preparativos das cidades-sede brasileiras para a Copa 2014. Como presidente do órgão, Moreno é o responsável pela reforma do Maracanã. Impressionou-me sua franqueza ao ser perguntado sobre os atrasos nas obras do estádio carioca.
“Brasileiro trabalha é na pressão mesmo, é uma cultura nossa. Se o estudante europeu tem que entregar um trabalho daqui a dez dias, ele termina um mês antes. O brasileiro acaba o trabalho no mesmo dia, e chega lá equivalente ao dele [europeu] ou melhor. É assim também nas obras, e em tudo”, disse.
Moreno têm razão quando diz que o atraso faz parte de nossa cultura – e isso fica muito evidente para um brasileiro que vive no Reino Unido, como eu. O que me surpreende em sua frase é a conotação positiva atribuída ao atraso: uma coisa é ter a capacidade de concluir projetos sob pressão; outra é ter que executá-los a toque de caixa devido à sua própria falta de planejamento.
Nesta semana, um bom exemplo da importância de se concluir obras de grandes eventos com antecedência pôde ser observado em Londres. Algumas das instalações olímpicas receberam eventos-teste dos Jogos 2012. A Arena de Handebol do Parque Olímpico sediou a London Handball Cup; o centro de exposições ExCeL London, competições de boxe, tênis de mesa e esgrima. Em breve ocorrerão testes de judô, taekwondo, saltos ornamentais e ginástica olímpica, entre outras modalidades.
Os eventos-teste são uma oportunidade para que os londrinos que não conseguiram ingressos para os Jogos conheçam as instalações – alguns são abertos ao público em geral; outros, apenas para moradores das regiões próximas ao Parque Olímpico. Mas acima de tudo são a chance de detectar e corrigir eventuais problemas que naturalmente ocorrem quando se organiza um evento de tamanha complexidade.
Em julho, por exemplo, um evento-teste de hipismo em Greenwich serviu para que se constatasse que o solo estava pesado demais, na opinião dos cavaleiros. A Arena de Basquete, testada em agosto, passará por ajustes em sua acústica. O circuito de BMX também terá seu percurso corrigido, após também passar por testes em agosto.
Nada disso seria possível se as instalações ficassem prontas às vésperas da realização dos jogos. O brasileiro pode ser capaz de realizar obras em curto prazo, “na pressão”, como vangloriou-se Moreno na entrevista a PLACAR. Mas, ao fazê-lo, abre mão de poder detectar e corrigir problemas. A cultura do atraso não deveria se tornar um culto ao mesmo.
Veja

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