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terça-feira, 1 de novembro de 2011

Para consertar o bonde, tem que quebrar Santa Teresa

Rio de Janeiro

Todos os 17 quilômetros de trilhos precisam ser trocados, o que implica em obras pesadas nas ruas da Montmartre carioca. Presidente da Central avisa: antes de dois anos, sistema não volta a funcionar

Parte do bonde de Santa Teresa foi arrancada pela colisão. Suspeita é de que composição tenha perdido freio na ladeira da rua Joaquim Murtinho


Parte do bonde de Santa Teresa foi arrancada pela colisão. Suspeita é de que composição tenha perdido freio na ladeira da rua Joaquim Murtinho - Felipe O'Neil/Ag.O Dia

“Desafio alguém a dizer que há algo que se aproveite nesse sistema. Os trilhos estão condenados, gastos. Não pode ser esse o trilho, temos que usar o bilabiado”, sentencia Macedo
Eduardo Macedo pegou o bonde andando. A piada é velha, mas a situação não tem mesmo graça. O engenheiro de 66 anos assumiu algo ainda pior, ao aceitar a presidência da Central. Embarcou, assim, em um sistema descarrilado, com seis mortos na conta da empresa e o compromisso de restabelecer o transporte sobre trilhos na Montmartre carioca. É um problemão, composto basicamente de uma investigação sobre a tragédia de 27 de agosto no Rio e um plano para fazer funcionar uma máquina sucateada.

Na última terça-feira, ele apresentou a Sérgio Cabral o que considera o X da questão para a tragédia de Santa Teresa. O governador do Rio já suspeitava, mas ouviu, desta vez com amparo técnico, que o sistema precisa ser todo trocado, a começar pelos trilhos. E mexer em trilhos em um bairro histórico, com ruas, pavimentação, galerias e casas antigas, é mexer em toda a infraestrutura do bairro. Ou seja, para consertar os bondes, tem que quebrar Santa Teresa.
Divulgação/Central
Eduardo Macedo, presidente da Central: bondes não voltam a funcionar em prazo inferior a dois anos
Eduardo Macedo, presidente da Central: bondes não voltam a funcionar em prazo inferior a dois anos
“Desafio alguém a dizer que há algo que se aproveite nesse sistema. Os trilhos estão condenados, gastos. Não pode ser esse o trilho, temos que usar o bilabiado”, sentencia Macedo, depois de ouvir especialistas de Portugal, da Carris, que operam um sistema de características semelhantes. A partir da conversa com o governador, serão chamados a participar da empreitada a Cedae, que opera água e esgoto; a Light, que já participa do projeto de substituição da rede aérea para os bondes; a CET-Rio, para cuidar do nó que vai se fazer no trânsito; e órgãos da prefeitura, que terão que autorizar o desmonte de ruas inteiras.
Henrique Freire/Divulgação/Central
Trilhos bilabiados, no trecho Silvestre, atualmente desativado: desgaste exige substituição de toda a linha dos bondes no bairro
Trilhos bilabiados, no trecho Silvestre, atualmente desativado: desgaste exige substituição de toda a linha dos bondes no bairro
“De forma alguma o bonde volta a andar num período inferior a dois anos”, diz Macedo. “E não adianta vir o Ministério Público dizer que tem que funcionar em dois meses. Não dá”, ressalta. O processo será longo. E envolve uma licitação internacional, pois os trilhos em questão só são fabricados na Europa. Só para preparar essa licitação o prazo deve ser de seis meses. O custo aproximado é obtido por Macedo com a multiplicação dos 50 euros do metro do trilho, por 17 quilômetros da malha de Santa Teresa, por dois – afinal, os trilhos caminham lado a lado – e pelos 2,46 do câmbio do euro, é de cerca de 4 milhões de reais. Já para instalação, com todas as obras necessárias, ainda não se sabe.

Bilabiado – Em vez do sistema de trilho e contratrilho usado atualmente – em que cada lado tem dois trilhos independentes, e justamente por isso sujeitos a desgastes e deformações diferentes – o sistema bilabiado consiste em apenas uma peça de cada lado. É mais adequado a bondes para locais como Santa Teresa, pois reduz-se o risco de um descarrilamento, de deformações na linha.

Macedo, com uma equipe da Central, foi a Lisboa conhecer o sistema operado pela Carris. Lá a coisa é diferente, pois o bonde é um transporte de massa, com linha de cerca de 70 quilômetros, contra os 17 de Santa Teresa. O monitoramento é computadorizado. Depois da visita, o presidente da Central não tem dúvida: o sistema do Rio parou no tempo. “Aqui, o trilho e o asfalto estão acabados, há desnível, desgaste. Em Lisboa, dá pra pentear o cabelo usando o trilho como espelho”, compara.

Seria de arrancar os cabelos – se Macedo ainda os tivesse. Cabeluda, mesmo, é a forma como os bondes amarelinhos, cartão-postal do Rio, foram se acabando, desmanchando no balanço das viagens e na inércia do descaso. O controle de tráfego na estação Carioca dos bondes usava a tecnologia celular. Ou seja, na estação, um funcionário telefonava para o motorneiro, que, conduzindo o bonde, atendia, para saber se poderia prosseguir ou se havia risco de bater noutra composição.


Peritos no local do acidente: ranhuras indicam excesso de peso no bonde 10, acidentado no sábado


Peritos no local do acidente: ranhuras indicam excesso de peso no bonde 10, acidentado no sábado - Fabrizia Granatier


Problemas na rede aérea: risco de curto circuito e de rompimento dos cabos, com risco para pedestres


Problemas na rede aérea: risco de curto circuito e de rompimento dos cabos, com risco para pedestres - Fabrizia Granatier


Os porblemas nos trilhos estão ao longo de todo o percurso dos bondes


Os porblemas nos trilhos estão ao longo de todo o percurso dos bondes - Fabrizia Granatier

Em uma junção, a falta de limpeza expõe os veículos ao risco de tombamento


Em uma junção, a falta de limpeza expõe os veículos ao risco de tombamento - Fabrizia Granatier

Uma cratera nos trilhos: o problema pode causar um súbito desequilíbrio e o tombamento do bonde


Uma cratera nos trilhos: o problema pode causar um súbito desequilíbrio e o tombamento do bonde - Fabrizia Granatier


Trilhos desnivelados: risco de balanço fora de controle que pode lançar os passageiros para fora do bonde


Trilhos desnivelados: risco de balanço fora de controle que pode lançar os passageiros para fora do bonde - Fabrizia Granatieri

Oxidação e corrosão ao longo dos trilhos: risco de descarrilamento


Oxidação e corrosão ao longo dos trilhos: risco de descarrilamento - Fabrizia Granatieri

Um dos controles do bonde: maquinista foi um dos primeiros a morrer no choque


Um dos controles do bonde: maquinista foi um dos primeiros a morrer no choque - Fabrizia Granatier
Destroços na garagem dos bondes: local não tem vigilância


Destroços na garagem dos bondes: local não tem vigilância - Fabrizia Granatier

Marcas de sangue nos destroços do bonde número 10


Marcas de sangue nos destroços do bonde número 10 - Fabrizia Granatier


Sem proteção, curiosos passeiam sobre os trilhos


Sem proteção, curiosos passeiam sobre os trilhos - Fabrizia Granatier


Uma junta de dilatação com problemas: falta de manutenção é flagrante ao longo de toda a linha



Uma junta de dilatação com problemas: falta de manutenção é flagrante ao longo de toda a linha - Fabrizia Granatier


Fora dos trilhos: falta de dormentes e peças marcadas com um "X", para substituição


Fora dos trilhos: falta de dormentes e peças marcadas com um "X", para substituição - Fabrizia Granatier


Alexandre Bruno, do Sindicato dos Ferroviários, mostra a falha na tela de proteção: problema causaou a morte de um turista francês


Alexandre Bruno, do Sindicato dos Ferroviários, mostra a falha na tela de proteção: problema causaou a morte de um turista francês - Fabrizia Granatieri

Um menino anda de bicicleta sobre os trilhos, próximo aos Arcos da Lapa


Um menino anda de bicicleta sobre os trilhos, próximo aos Arcos da Lapa - Fabrizia Granatier

Passeio perigodos: sem grades de proteção ou vigilância, pessoas passeiam sobre os trilhos


Passeio perigodos: sem grades de proteção ou vigilância, pessoas passeiam sobre os trilhos - Fabrizia Granatier

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