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domingo, 9 de outubro de 2011

A vida sem Steve Jobs

Getty Images
O cofundador da Apple, Steve Jobs, teve sua morte confirmada pela empresa nesta quarta-feira (5)
O cofundador da Apple, Steve Jobs, teve sua morte confirmada na última quinta feira, dia 5/10/2011

Eu estava chegando em Congonhas depois de encontro com leitores no RS, desses ótimos encontros que servem para lembrar da razão pela qual a gente vira escritor, além dos prêmios, dos milhões e da nossa foto na capa da Caras, claro. Ainda no ônibus do aeroporto, liguei o celular para saber o que tinha acontecido entre o meu Grêmio e o Santos enquanto eu estava em modo avião. E em algum ponto do trajeto, através do Twitter, entrou a mensagem que apagou as luzes ao meu redor, mesmo que de maneira metafórica. Steve Jobs estava morto.
Mesmo o beiço à prova de emoções desse neto da minha avó Jovita tremeu, caros leitores. Ali mesmo, na pista de Congonhas, ao lado de um Airbus 320, se não chorei, lamentei profundamente a morte desse sujeito tão único e presente em nossas vidas. Steve Jobs trabalhou duramente e ganhou bilhões mudando dramaticamente, e para melhor, o jeito de fazermos as coisas. E, suspeito, ele teria trabalhado do mesmo jeito sem os bilhões, porque o negócio dele não era ganhar dinheiro, e sim transformar o que ele sabia que podia ser transformado. Diferente de muitos outros bilionários, Steve Jobs é daqueles que vale cada centavo e ainda nos faz sentir que saímos lucrando, e saímos mesmo.
Eu não sou, nunca fui, um usuário de Macs. A Apple em si nunca me fez sentir o que encanta a tanta gente. Pessoalmente, nunca me senti à vontade escrevendo num Mac, o que, para um escritor, chega a ser um certo problema. Sempre achei a Apple uma autoritária com pinta de boazinha, algo meio Marina Silva, sabem? Como no momento em que ela resolveu abolir o disquete, antes que o mundo tivesse chegado lá, ou acreditar que os seus aparelhos não precisam de conectividade com o mundo via USB, ou de flash, ou nos impondo a vida através do Itunes.
Isso, caros leitores, não importa tanto quanto o que Steve Jobs nos deu. Eu lembro no mundo pré-Windows, lembram? Do DOS? NUNCA a internet teria se transformado no que ela se transformou se ela estivesse na mão da Microsoft apenas. A Microsoft é fruto de outra maneira de ver o mundo, que inclui muitas coisas, mas exclui a arte. E Jobs era, acima de tudo, um artista com outros talentos.
Vocês imaginam o que a internet teria sido se a IBM estivesse no comando? A internet nunca teria se transformado no que ela se transformou se ela não tivesse virado essa coisa cheia de imagens, sons e mouse e aí está a mão de Jobs na sua primeira fase, estranhamente interrompida por idiotas no controle da Apple que demitiram Jobs para colocar um ex-executivo da Pepsi, na mais burra decisão jamais tomada na história da humanidade. Para sorte de todos, eles se deram conta disso e foram buscar Jobs de volta. E ele não queria outra coisa, porque tinha compreendido o que seria possível fazer com a tecnologia e com a internet como ninguém mais e agora teria a plataforma para apresentar a sua verdade ao mundo.
O que vimos foi a sequência de inovações que tira o fôlego quando paramos para pensar. O Ipod liquidou de vez com a indústria do disco, ao mesmo tempo em que insinuou que ali estava parte da solução que iria juntar tudo em um só lugar. O Iphone redefiniu o uso das nossas mãos e as conectou definitivamente à nossa mente. O Ipad criou as condições essenciais para não mais termos jornais e revistas em papel e deu forma e consistência a esse mundo novo em que vivemos, em sua extrema virtualidade. Com essas inovações criadas por Jobs, foi construída a famosa convergência digital, que todo mundo buscava sem saber ao certo como ou onde. E ele a usou não apenas para desenvolver produtos, não, mas sim para modificar comportamentos e realidades. Ele criava o mundo no qual os produtos dos outros não mais fariam sentido e os seus seriam dominantes. Para isso, ele criou um mundo; esse aí ao seu redor.
A morte de Steve Jobs entristece por ser uma morte e de alguém com apenas 56 anos de idade. Ela choca por deixar claro que todo o poder não é suficiente para enfrentar algumas doenças, ainda hoje. Ela empobrece o mundo porque é óbvio que com Jobs vivo teríamos muitos anos de surpresas e transformações pela frente. Steve Jobs não apenas as apresentava, mas a presença dele ali nos assegurava que o que ele estivesse mostrando era sim o que vínhamos - sem saber - buscando. A confiança que tínhamos nele não se reproduz, e outros podem apresentar as próximas maravilhas sem que elas peguem, simplesmente por não serem Jobs.
Essa é a nossa perda, caros leitores. O mundo vai mudar menos, ou com maior dificuldade, e isso nos atinge a todos. Eu sinto pelo que não vai mais acontecer. A vida sem Jobs é uma vida com menos surpresas e com menor ruptura com o passado. A vida sem Jobs é aquela vida que eu não prefiro, e é nela que eu, você que lê, o senhor aqui ao lado vamos passar o resto dos nossos dias.
Steve Jobs não vai mais acordar para olhar árvores, sol e maçãs, e não vai mais criar novas formas de transformar a todos nós em seres desse inacreditável século 21, no qual vivemos, no qual vamos seguir vivendo, sem ele. Azar de todos nós, pesar de todos nós que nos sentimos parte do contemporâneo que ele compreendeu como ninguém mais.
Marcelo Cunha

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