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quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

Bruxelas: a rota do chocolate

Por Amy M. Thomas, The New York Times News Service/Syndicate
 
 
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O chocolate - como o vinho, a moda e as finanças - se tornou um fenômeno cultural complexo. Há chocolate básico para as massas, chocolate artesanal para os puristas e criações vanguardistas para os peritos. Em Bruxelas, uma cidade poliglota localizada na encruzilhada geográfica e cultural da Europa, é possível encontrar tudo isso.
A capital da Bélgica pode ser conhecida como a Capital da Europa, mas também é, pelo menos no que concerne a maioria dos aficionados em chocolate, a Capital Mundial do Chocolate. Desde que Jean Neuhaus, um chocolateiro de Bruxelas, inventou o praliné 100 anos atrás, a cidade tem estado na vanguarda do negócio dos chocolates. Lá vivem um milhão de habitantes e cerca de 500 chocolateiros, cerca de um chocolateiro para cada 2 mil pessoas. O belga consome em média mais de seis quilos de chocolate todo ano, uma das mais altas taxas do mundo.


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Atualmente, porém, o setor está mudando. Com países como Alemanha e Holanda se tornando exportadores europeus maiores, uma nova classe de chocolateiros da Bélgica está encontrando formas inovadoras para manter o seu país na liderança quando o assunto é chocolate. Eles estão se afastando dos pralinés tradicionais - que os belgas classificam como qualquer bombom de chocolate recheado com um núcleo de fondant macio - e infundindo ganaches com sabores exóticos, como wasabi ou limão verbena, e inventando misturas originais, como groselha-preta com cardamomo e framboesa com cravo.
Eu tinha experimentado um pouco da dicotomia entre clássico e contemporâneo que caracteriza os chocolates de Bruxelas em 2010, durante um breve pernoite, vinda de Paris. Mas entre o mercado de pulgas, a degustação de cervejas e um passeio pelas ruas em estilo art nouveau - outros dos grandes atrativos de Bruxelas - sobrou pouco tempo para o chocolate.


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Retornei à cidade no semestre passado, então, com a intenção de explorar três séculos de história do chocolate em três dias. Foi uma tarefa ambiciosa: A cidade abriga duas das maiores empresas de chocolate do mundo, a Godiva e a Leonidas, bem como dezenas de butiques de chocolateiros populares e sofisticados. Para simplificar a minha estratégia de experimentação, consultei a americana Robbin Zeff Warner, ex-professora de Redação da Universidade George Washington, que publica blogs sobre chocolates belgas desde que o cargo de seu marido na OTAN a levou a morar em Bruxelas a partir de 2008.


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"Existem chocolates para os turistas e chocolates para os belgas", disse Warner a respeito da hierarquia nacional em que os chocolates produzidos por fabricantes como a Cote d'Or e Guylian são devorados em grandes quantidades, mas principalmente pelos 6 milhões de visitantes que passam pela cidade a cada ano. Os bruxelenses, segundo Warner, preferem os fabricantes artesanais. "As casas grandes e conhecidas são ótimas. Porém, ver e degustar um verdadeiro chocolate artesanal, e comprá-lo da pessoa que o fez, é algo especial."

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Quando estávamos saindo de Wittamer, o centenário chocolateiro do centro da cidade que seduz moradores e turistas com as receitas do seu patrimônio, Warner, para provar que tinha razão, sugeriu que fôssemos ao Alex & Alex, um bar de champanhe e chocolate localizado nas proximidades. Embora seus chocolates, feitos por Frederic Blondeel, não sejam preparados no local, são reconhecidos em alguns círculos como alguns dos melhores da cidade.

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O bar está situado em uma das ruas repletas de antiquários e galerias de arte próximas à Grand Sablon, a praça central de Bruxelas. Seu interior, escuro e acolhedor, junto à taça de Drappier rosé e a variedade de bombons quadrados que estavam à minha frente, foi uma pausa encantadora dos turistas que batiam perna em busca de chocolate do lado de fora. Achei as notas herbáceas do ganache de manjericão de Blondeel muito parecidos com pesto, mas os chocolates "Alex'Perience" foram outra história. A primeira impressão aveludada de um chocolate de alta qualidade foi seguida por uma afluência de cassis doce, com sabor de fruta.

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Passei a tarde circulando a Grand Sablon, que, com nada menos que oito chocolateiros, é o epicentro do chocolate da cidade. Eu provei trufas do tamanho de bolas de golfe da Godiva e chocolates em forma de cabeça de hamster da Leonidas, além de nugás orgânicos da Pure e ganaches mentolados da Passion. Na Neuhaus, experimentei uma trufa de chocolate amargo com recheio de creme de manteiga e com um biscoito belga picante chamado "speculoos".
Quanto mais eu andava, mais claro ficava que o nível de sofisticação está evoluindo. A embalagem e a apresentação das criações dos chocolateiros mais novos é tão elegante quanto a de uma sala de exposições da Place Vendôme, enquanto a terminologia associada - como "cru" e "domínio" - é parecida com o que ouviríamos de sommeliers. Foi assim na loja-conceito de dois andares de Pierre Marcolini. Vendedoras sorridentes se colocavam frente a um display envidraçado repleto de pequenos bombons retangulares que pareciam tão requintados quanto joias. Na parede oposta, as prateleiras iluminadas exibiam o motivo da fama de Marcolini: suas exclusivas barras de chocolate Grand Cru.

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Na manhã seguinte, fui a um museu, o que foi divertido e diferente. Antes de entregar minhas moedas ao entrar, fui presenteada com um biscoito que tinha sido preparado sob uma torneira de chocolate derretido. Eu estava no interior do Museu do Cacau e do Chocolate, de 314 anos, cujo prédio está em condições um tanto precárias. Cheguei bem a tempo de ver a demonstração seguinte, feita por um homem de sobrancelha espessa, à frente de um tonel de chocolate, em uma cozinha de luzes fluorescentes.
Aprendi que a Europa foi apresentada às sementes de cacau quando os exploradores espanhóis as trouxeram de volta do que hoje é o México, no final do século XVI. Elas chegaram à Bélgica cerca de 100 anos depois. Quando o rei Leopoldo II colonizou o Congo Africano em 1885, em grande parte pelas culturas de cacau, o consequente genocídio ficou marcado como um momento negro na história do país. Foi também naquela época que o chocolate belga começou a adquirir uma reputação formidável.

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Quando o chocolate esfriou para a temperatura ideal de 32 graus Celsius, o instrutor o dividiu, ainda líquido, em duas tigelas, raspando a película que restou em linhas bem arrumadas. Era um subproduto valioso: a manteiga de cacau, que é em grande parte responsável pela superioridade do chocolate belga, já que os chocolateiros locais se recusam a acrescentar a ele óleos vegetais ou gordura, como é feito em alguns outros países.
Após a instrução veio a diversão. Nós mergulhamos porções de ganache em nosso chocolate e as fizemos rolar sobre biscoitos de amaretto esmagados, castanha do Pará e merengue em pó, criando trufas imperfeitas, mas saborosas. Derramamos círculos de chocolate e os recheamos com castanha de caju, pistache, amêndoas, oxicocos secos e passas, produzindo iguarias conhecidas como "mendiants". Logo estávamos indo embora, com delícias suficientes para satisfazer uma ou duas turmas de jardim de infância.

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Após a aula, eu vaguei pela Ixelles, e pela Moss & Bros, uma das muitas butiques de roupas e utensílios domésticos da moda da região. Acabei me envolvendo em uma conversa com a gerente da loja - sobre chocolate, naturalmente. Ela me contou do seu chocolateiro favorito na cidade, Laurent Gerbaud, e insistiu que eu o visitasse.


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E foi assim que eu fui parar no ateliê de Gerbaud, na movimentada Rue Ravenstein, na manhã seguinte, observando uma profusão de bombons aveludados com figos de Esmirna, gengibre de Guilin e avelãs do Piemonte. Tal crédito concedido a ingredientes de outros países é o diferencial dessa nova geração de chocolateiros. E ao continuarem a ampliar os limites da criatividade, eles também estão reescrevendo a história do chocolate belga.
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